Rangel Alves da Costa*
O povo sertanejo, este compreendido como os habitantes da regiĆ£o semi-Ć”rida do Nordeste brasileiro, numa extensĆ£o de 868 mil quilĆ“metros, abrangendo o norte dos Estados de Minas Gerais e EspĆrito Santo, os sertƵes da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, ParaĆba, Rio Grande do Norte, CearĆ”, PiauĆ e uma parte do sudeste do MaranhĆ£o, inspirado por Deus na convicção de que na terra o homem Ć© o dono do seu próprio destino e
Considerando que sobre a terra sertaneja todos nascem iguais em direitos e obrigações, sem distinção de origem, raça, sexo, cor, naturalidade e quaisquer outras formas de discriminação,
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da famĆlia sertaneja deve prevalecer sempre na consciĆŖncia dos demais brasileiros e de outros povos, dos governantes, autoridades e gestores pĆŗblicos,
Considerando ainda que āo sertanejo Ć© antes de tudo um forteā, e nesta qualidade busca atravĆ©s do trabalho sua digna sobrevivĆŖncia, atravĆ©s do respeito ao próximo sua pacificação social e atravĆ©s de suas lutas suas conquistas,
Convencionou o seguinte:
ARTIGO I
Denomina-se sertão toda a extensão semi-Ôrida de terra concedida por Deus ao homem nascido no lugar misturado às plantas e animais, tendo como limites ao norte o sol ardente da agonia, ao sul a esperança renovada com as nuvens carregadas que molham o chão, a leste o latifúndio improdutivo e a oeste as plantas que brotam do esforço do pequeno agricultor.
Denomina-se sertanejo o habitante desses limites, ser humano sem fronteiras na força e na coragem, ilimitado na sua constante busca por dias melhores em meio às intempéries da natureza e do abandono dos governantes.
ARTIGO II
Na sua condição de cidadão, deve ser finalidade de todo sertanejo praticar o bem e viver em paz, uns com os outros, como bons vizinhos, e unir as forças para manter respeitado o nome do sertão em toda e qualquer situação que possa haver desonra ao seu povo, sua história, sua geografia, seus aspectos econÓmicos e sociais, seus costumes, lendas, tradições e religiosidade.
ARTIGO III
O sertanejo desfrutarÔ de todos os direitos gerais e inalienÔveis relativos à pessoa humana enunciados na Constituição Federal do Brasil e nas demais legislações, garantindo-lhe o ideal comum do respeito à sua dignidade, integridade, educação, saúde, trabalho, moradia, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, ambiente sadio e preservação de seu patrimÓnio cultural, dentre outros.
O desrespeito a quaisquer desses direitos serÔ tido como crime de lesa-pÔtria sertaneja e crime por omissão, considerando-se ainda a circunstância agravante do preconceito e discriminação.
ARTIGO IV
A propriedade da terra, de animais e outros bens que constituam o seu patrimĆ“nio, e deste possa usar, gozar, dispor e reaver, deve constituir o fruto maior do trabalho de quem luta de sol a sol, vencendo as dificuldades impostas e realizando-se com o pouco ou muito construĆdo.
A posse da terra, para nela morar, criar, plantar e colher, deve ser considerada verdadeira bandeira de luta do sertanejo excluĆdo do poder de dispor desse bem maior que garanta o sustento próprio e de sua famĆlia.
Na luta pela terra, deverÔ ser abolida a mera detenção do bem em nome de outro ou sob instruções suas, de modo que o dono seja realmente aquele que nela trabalha e produz.
ARTIGO V
As secas e estiagens, ao lado de serem consideradas como fenÓmenos da natureza causados pela falta ou insuficiência de chuvas, devem também ser vistas como processos gerados pelo próprio homem, sertanejo ou não, que desmata desnecessariamente grandes extensões da vegetação nativa, destrói as matas ciliares, descaracteriza a geografia da região e interfere no curso natural das coisas em nome do progresso e do desenvolvimento.
ARTIGO VI
No cotidiano de convivĆŖncia com as secas e estiagens e no combate aos problemas por estas causados, o sertanejo se valerĆ” de suas próprias forƧas e das reservas que necessariamente faz para enfrentar situaƧƵes de falta de alimentos e de Ć”gua, e jamais serĆ” submetido ou deixarĆ” se submeter aos favores escusos dos ricos e Ć s esmolas desmoralizantes dos polĆticos e governantes.
ARTIGO VII
O poder de votar e ser votado do sertanejo, na condição de cidadĆ£o no pleno exercĆcio de seus direitos e deveres polĆticos, deve significar atuação ativa, crĆtica e consciente, e nĆ£o expressĆ£o de submissĆ£o a partidos, grupos polĆticos ou candidatos.
O voto, enquanto instrumento democrÔtico eletivo, sob hipótese alguma poderÔ ser objeto de troca por qualquer bem ou vantagem que seja entregue ou oferecida por candidato.
DeverÔ ser dada preferência de voto ao candidato que jÔ tenha demonstrado ou efetivamente demonstre compromisso com a solução dos problemas que afligem a região sertaneja. Quem não possua esse perfil deverÔ ser expurgado da escolha do sertanejo.
ARTIGO VIII
Nenhum sertanejo poderĆ” ser objeto de perseguição polĆtica no seu exercĆcio profissional, ou em qualquer outra situação, em virtude de suas opiniƵes, preferĆŖncias de voto, vinculação a grupos polĆticos ou filiação partidĆ”ria.
ARTIGO IX
Fica decretado que doravante todo sertanejo deve ser o responsĆ”vel maior pelo zelo e preservação do nome de sua regiĆ£o, denunciando situaƧƵes de desvirtuamento dos fins da administração pĆŗblica, prĆ”tica da corrupção, enriquecimento ilĆcito, proliferação da violĆŖncia e aumento da misĆ©ria e das degradantes condiƧƵes de vida da população, dentre outros fatores que maculam ainda mais a imagem desse sertĆ£o jĆ” historicamente sofrido.
ARTIGO X
O presente Estatuto entrarƔ em vigor na data em que cada sertanejo, livre e conscientemente, quiser acatar suas disposiƧƵes.
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com