Evolução do pensamento geográfico

 

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EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO

A geografia, uma ciência e uma matéria de ensino. Como ciência da sociedade e da natureza, constitui um ramo do conhecimento necessário á formação de professores.  Ela se faz presente na vida cotidiana de todo cidadão, seja pela ânsia de conhecer o mundo, seja pelos desafios postos pelo meio ambiente pelas exigências de planejamento territorial, pelo turismo, ou simplesmente como tarefas escolares do ensino básico.

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Nesse sentido, a concepção geográfica passou por diferentes momentos, através das correntes do pensamento geográfico, gerando reflexões distintas acerca dos procedimentos e métodos do pensar e fazer geográfico, onde se faz necessário a busca do entendimento das abordagens que sustentaram a evolução da geografia para a compreensão dos novos paradigmas que permeiam o saber geográfico atual.

Diante desse contexto, é que o presente capitulo tem como objetivo abordar a evolução do pensamento geográfico como suporte para a compreensão sistemática da relação intrínseca existente entre as correntes do pensamento geográfico e o processo ensino-aprendizagem em Geografia.

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1 – Origem do saber geográfico.

A Geografia, como ciência, avançou em seus vários ramos. Houve extraordinário acúmulo de conhecimento geográfico, de origem empírica ou científica, que se desenvolveram desde as primeiras cartas e descrições produzidas na China.

É  uma das ciências de história mais longa. Nesse sentido, pode-se afirmar que ela começa, com as primeiras comunidades gentílicas. Não se têm registros de migrações anteriores ao passado histórico, entretanto, admite-se que o homem se dispersou muito cedo na superfície terrestre, vez que não foram detidos pelos obstáculos geográficos, nem mesmo os mares ou as altas cadeias de montanhas, deixando vestígios por toda parte. (Sodré, 1992).

O conhecimento geográfico foi significante nas grandes descobertas marítimas, e a institucionalização da Geografia, no chamado mundo ocidental, somente ocorreu com as expedições científicas pela África, América e Ásia sob o respaldo das associações geográficas e das academias europeias, que sistematizaram as informações coletadas pelos cientistas em suas viagens pelo mundo.

Em se tratando desse processo evolutivo Cristofolett (1999, p.5) afirma que: “todos os pensadores da Antiguidade e Idade Média que descreveram as características de paisagens e povos situados em lugares da superfície terrestre são exemplos de geógrafos”.

Viagens realizadas nos séculos XV e XVI oferecem á Europa informações detalhadas e precisas sobre o resto do mundo. Em 1570 o cartógrafo flamengo Abraham Ortelius organizou vários mapas sobre a forma de livro, no primeiro atlas de que se têm notícias.

James Cook, no século XVIII, fixou novos padrões de precisão e técnica em navegação, realizando viagens de cunho científico e , na segunda delas, a mais comentada, de 1772 a 1775, circunavegou o globo.

Até o final do século XVIII, não é possível falar de conhecimento geográfico sistematizado. O que se tem é uma geografia construída a partir de relatos de viagens, escritos em tom literário; compêndios de curiosidades (sobre diversos lugares já visitados), relatórios estatísticos de órgãos de administração, obras sintéticas sobre os fenômenos naturais e incertos sobre os mais variados pontos da superfície terrestre. A questão do conhecimento da superfície terrestre tem seu lugar nas análises de Moraes (1998, p.34):

“Estes pressupostos  históricos  de   sistematização

Geográfica  objetivam-se  no  processo de  avanço

e  domínio das  relações  capitalista  de  produção.

Assim,   na    própria   constituição  do   modo   de

produção capitalista.

O primeiro destes   pressupostos dizia respeito  ao

conhecimento efetivo da extensão real  do  planeta.

Isto  é,   era  necessário que  a   terra   toda   fosse

necessário que a terra toda fosse   conhecida  para

que fosse pensada de forma unitária  o seu estudo.

O conhecimento da  dimensão  e da forma real dos

continentes era  a base  para as idéias  de  conjunto

terrestre,  concepção     basilar   para   a    reflexão

geográfica”.

Para compreender o que foi, de fato, a evolução do pensamento geográfico, o pressuposto mais importante era o conhecimento efetivo de todo o planeta. Essa condição é dada com a expansão européia, as primeiras viagens de circunavegação já em meados do século XVII. A expansão marítima, os descobrimentos, a posterior apropriação de novas áreas do globo, enumeram-se como parte ativa do processo de sistematização geográfica. Inúmeras descrições fornecem base empírica para a comparação entre as áreas. Com o acúmulo de informações, o aprimoramento das descrições e a expansão mercantil, surgem paralelamente às representações cartográficas, necessárias para a localização das terras e portos. O uso dos mapas vai popularizar-se com a descoberta e o aprimoramento das técnicas de impressão (Moraes 1989).

A Geografia encontrou, porém, fora do campo das ciências da natureza, meramente discritiva, outras colaborações que impulsionaram a sua existência. No conhecimento filosófico, encontram-se temas que tratam da Geografia, como relata Morais (1998, p.22-23).

“O pensamento iluminista principalmente revela,  em

suas formulações um dos temas  mais  destacados

do  universo   de   preocupações    da     Geografia

Moderna,   qual   seja:   a  questão  da   relação   da

sociedade  com  o  território. Esse tema, de tradição

no  pensamento  político  desde a  Renascença,  vai

ocupar um  papel  de  destaque  nas formulações de

vários   pensadores   da   Ilustração.  São  bastantes

conhecidas,    por    exemplo,   as    colocações   de

Montesquieu, relacionando as formas de relevo  com

a índole dos povos, ou as colocações de Rousseau,

relacionando as  formas de governo com a extensão

dos territórios”.

Eram abordados temas como éticas e políticas em que Kant, Hengel e até mesmo Comte escreviam em suas teorias e que tinham considerações geográficas. Os economistas políticos, ao tratar de temas como produtividade, recursos minerais, aumento populacional, entre outros, ampliavam as discussões do saber geográfico. Entre eles, destacavam-se Adam Smith e Malthus. As teorias evolucionistas que infocavam a influência do meio sobre o desenvolvimento dos organismos, são pressupostos geográficos, e, entre os autores evolucionistas, destacaram-se Lamarck, Haeckel e Darwin que com suas teorias explicavam o mundo através da problematização geográfica.

Embora lançado raízes históricas ao longo dos séculos, a sistematização do conhecimento geográfico só vai ocorrer somente no século XIX com Alexandre Von Humboldt e Carl Ritter que a Geografia Moderna tem sua gênese. As constribuições e as idéias apresentadas pelos geógrafos alemães e franceses determinaram o desenvolvimento dessa ciência.

 

 

2 – Humboldt e Ritter: precursores da Geografia

O conhecimento geográfico, no sentido de uma Geografia sistematizada surge com os geógrafos Humboldt e Ritter na Alemanha. Nesse sentido, a Geografia enquanto disciplina, tem suas primeiras cadeiras universitárias em 1870 na Alemanha, onde residem as determinações históricas específicas, explicativas do processo de sistematização do pensamento geográfico, pelo que informa Morais (1989).

O surgimento e a eclosão da Geografia, no inicio do século XIX, está ligada historicamente ao desenvolvimento do  capitalismo na Alemanha que  marca de forma decisiva as formas de pensamento que ali acontecem. As transformações ocorridas em todo o território alemão em busca da unificação territorial foram marcadas por diversidades e conflitos. Podemos destacar desta época a questão da nacionalidade. Moraes (1989, p.66) evidência:

“Os   nexos  entre  a  particularidade   histórica    da

Alemanha    e   o   afloramento   do   processo    de

Sistematização  do  pensamento  geográfico  nesse

país,(…)evidenciam-se com clareza. Existem alguns

laços entre  o  temário dessa disciplina  e  interesses

políticos colocados na prática da sociedade  alemã,

cuja identidade fala por si mesma.  É  na  Alemanha

a que se deve buscar as discussões  mais  ardentes

sobre  as     relações    entre    a     Geografia   e   a

organização política ao final do século XVIII”.

Humboldt desfrutava de uma formação de naturalista e realizou enumeras viagens, e durante cinco anos explorou a América Latina, visitando países como Venezuela, Peru, México, Colômbia e Equador. Sua proposta de Geografia aparece na legitimação e desenvolvimento de seus próprios procedimentos de análise  e  em termos de método, Humboldt  apresenta  o  “ empirismo raciocinado”, isto é, a instituição a partir da observação. Ritter, nas suas obras, trás explicita a metodologia. Em seu principal trabalho, Geografia Comparada, existe um intuito deliberado de sugerir uma Geografia,  sendo assim um livro normativo.

A obra destes dois autores compõe a base da Geografia Tradicional, e todos os trabalhos que vem depois vão  se remeter ás formulações de Humboldt e Ritter, seja para aceitá-las, ou rejeitá-las.

Karl Ritter, Geógrafo alemão, foi o fundador da moderna ciência da geografia. Em 1820, assumiu a cátedra de história da Universidade de Berlim, na qual se manteve como professor até o fim de sua vida. Seu trabalho mais importante enfatiza a influência de fenômenos físicos na atividade humana, publicaram seu trabalho sobre a geografia com uma série de mapas sobre a Europa, uns dos primeiros atlas físicos da história 1860, que seria atualizado em 1811.

3.  As correntes do pensamento Geográfico

 

           A Geografia Racionalista tem como precursores A. Hettner e R. Hartshorne que buscam outros caminhos para a análise geográfica sem debruçar no determinismo ou mesmo no possibilismo.

Dentro da Geografia Tradicional, a Geografia Racionalista, procurou dar conta do saber geográfico com uma ênfase maior para o raciocínio dedutivo. Hettner propõe a Geografia como ciência que estuda “a diferenciação das áreas” dando explicações sobre a diversidade da paisagem, a partir do entendimento das interpelações entre os diferentes fenômenos de uma (lugar), sem isolar os elementos do meio. O estudo da Geografia compreendida como diferenciação de áreas foi denominado por Hartshorne de Geografia Ideográfica  (MOARES, 1997, p. 87-89).

A Geografia de Hartshorne foi bastante defendida nos EUA. Após 1930, desenvolveram-se nos EUA duas escolas geográficas. A primeira aproximou-se da antropologia que elaborou a Geografia Cultural, quando Carl Sauer, seu formulador, fez suas análises através das formas de cultura que um povo cria, nas formas de organização do seu meio. A segunda escola aproximando-se da Sociologia Funcionalista e da Economia teve seus estudos voltados para a organização interna das cidades.

A Geografia nacionalista tinha um caráter amplo, em busca de uma Geografia Geral, trabalhando as inter-relações, fazendo uma abordagem variada, Segundo Morais (1998,p.88):

“Hartshone argumentou que os  fenômenos  variam

de  lugar  a  lugar,   que   as    suas   inter-relações

também  variam,  e  que  os  elementos   possuem

relações internas e externas  á  área. O  caráter  de

cada     área    seria    dado   pela   integração   de

fenômenos inter-relacionados”.

Analisando os fenômenos inter-relacionados Hartshone orientou também para a Geografia Nomotética, essa Geografia iniciou-se com análises de tópicos, viabilizando os estudos regionais, ou seja, as relações dos espaços com os seus contingentes populacionais.

Uma nova proposta envolve o pensamento Geográfico na década de 1950 em oposição á Geografia Tradicional, a Geografia Pragmática ou Geografia Aplicada.

A partir dos anos cinqüenta, a visão sistêmica, a utilização de modelos e a lógica matemática denotam a passagem de uma Geografia Clássica (Tradicional) para uma Geografia Moderna, a necessidade de se fazer Geografia uma ciência, um conhecimento moderno do  mundo. Segundo vários autores, o objetivo da pesquisa geográfica é a integração entre o conhecimento geográfico e a metodologia científica.

Movimento conhecido como a Nova Geografia ou Geografia Quantitativa, em que a qualificação é o fator mais relevante, valoriza as ciências matemáticas como novo paradigma metodológico. As outras ciências buscariam, no modelo da matemática, sua coerência, rigor e objetividade, como também, a unificação dos procedimentos e métodos, que se referem aos princípios lógicos, os quais (Gomes, 1996).

O estabelecimento de uma Geografia verdadeiramente científica e teórica deve possuir clareza, simplicidade, generalidade e exatidão. Segundo Gomes (1996. p263).

“ O cárater revolucionário da Geografia analítica  se

manifesta,   assim,   pelo   esforço   em    expulsar

qualquer raça tradicional do  campo  de  pesquisas

geográficas,   o   que   traduz   bem   a  vontade,  a

ruptura em relação a tradicional.  Por intermédio  de

novas  técnicas  e  perspectivas,  a Geografia  abre

caminhos  para o reconhecimento e o prestígio dos

novos tempos.

A Geografia Crítica surge nos finais dos anos sessenta e procura dar conta através das análises, de mecanismo que instrumentalizem as questões sociais. Ela contrapõe-se a Geografia Tradicional, instrumento de dominação da época. Dotada de grande potencial prático e ideológico, renova o pensamento geográfico reunido geográficos imbuídos de uma perspectiva transformadora, que negam a ordem estabelecida e busca soluções para os problemas afins – uma geografia comprometida com a qualidade de vida do homem.

Nessa década a importância de preservação do meio ambiente surge motivada a uma atividade sustentável que venha proteger o mundo de impactos ambientais e surge com intensidade no âmbito da Geografia. Isto se deve, principalmente, aos riscos ambientais  decorrentes da exploração exagerada dos recursos naturais pelo homem.

Ives Lacoste define, de forma clara, os objetivos e a postura da Geografia Critica em (Morais 1998, p.26): “A Geografia é uma prática social em relação á superfície terrestre”. Desse modo, estudos temáticos dedicados ao conhecimento das cidades, como também de outros grupos, incluindo: A Geografia dos excluídos, da fome, etc, extrapolou o isolamento do geógrafo, e um enorme leque de opções é aberto, Segundo Carlos (1999, p.7).

“ O processo de transformação  do  mundo  impõe

ao  conhecimento.  Um  movimento   constante   de

renovação, o  que significa  que  a  cada  dia  surge

novas  idéias  ou      refornulam-se as velhas, isto é,

reproduzem-se  idéias  nessa  cadeia infinita que é o

conhecimento, onde  somente a reflexão crítica  nos

permite efetivamente avançar”.

Diante desse contexto, a concepção interdisciplinar, aliada a interesses múltiplos, como, por exemplo, renovação metodológica, levou a Nova Geografia a redefinir conceitos. A evolução da Geografia, tal como foi apresentada ao longo deste capitulo, procura dar conta das correntes do pensamento geográfico contrabalançando as dicotomias entre o “antigo” e a “geografia moderna”, em que a valorização humana é imprescindível. A razão do ser da Geografia seria então a de melhor compreender o mundo para transformá-lo, a de pensar o espaço para que nele se possa lutar de forma mais eficaz.

A mudança se faz clara diante desse novo conceito, e a Geografia surge com a finalidade de formar cidadãos críticos, em prol da cidadania ambiental. Segundo os Parâmetros   Curriculares Nacionais (PCNs),  a transversalidade da questão ambiental é de grande relevância na educação geográfica.

A abordagem humanística estão embasadas nos trabalhos efetuados por Yi-fu Tuan, Anne Buttimer, Edward Relph e Mercer  Pawer, que se liga a fenomenologia existencial como a filosofia subjacente, vez que preocupa-se em analizar os aspectos essenciais dos objetivos através da consciência, fundamentando-se na experiência vivida e obtida pelo individuo, contrapondo-se ás observações da base empírica que não se fixam pelo objeto nem pelo sujeito.

A Geografia Humanística procura valorizar a experiência do cidadão ou de grupo, propondo entender o comportamento e as formas de sentir das pessoas em relação aos seus lugares e ambientes. Para cada cidadão, para cada grupo de pessoas existe uma percepção, concepção e visão do mundo, que se expressa através dos seus atos e valores para com o meio.

O primordial  para a Geografia Humanística é encontrar no grupo social, as raízes do comportamento no mundo ou meio em que se encere o homem, expondo uma observação sistemática do papel do simbolismo cultural. O objetivo é compreender como o fato espacial era primitivamente conhecido e vivido e chegar às questões de sentido e de intenção. O objetivo é descobrir  o homem deixado de lado pelas ciências sociais.

O pensamento geográfico passa por um processo de atualização. Derruba barreiras que estimulavam o inútil processo de decoreba. Esta nova visão conduz os geógrafos a uma nova perspectiva, a  uma revisão pautada na crítica, e para se concretizar precisa busca nas tendências do passado resposta para que não caia novamente num pensamento que não condiz com a nova realidade.

No Brasil, o movimento de renovação já é uma realidade, e sua jornada começou no declive da Geografia Pragmática, com o autoritarismo do Estado e a falta de liberdade de expressão e debates. Isso explica a insistência em se trabalhar com a Geografia Tradicional, que aparece em alguns momentos como elemento de resistência democrática. Determinado momento a Geografia Quantitativa , com determinados privilégios surge, e, para decepção dos cientistas e pesquisadores do pensamento geográfico, ela de certa forma, trazia incubada a um modelo econômico e político anti-social.

Atualmente procuramos uma proposta que se sustente num ideal humanístico, voltada para o bem estar social, uma Geografia que seja voltada para o homem como ser humano, capaz de julgar, criar, transforma e usá-la como instrumento de libertação.