O pagamento em cheque ainda gera dúvidas

É notório que o título de crédito cheque é amplamente utilizado nas transações financeiras atuais, sendo ainda hoje uma das mais corriqueiras formas de pagamento utilizadas no mercado. Todavia, em que pese a larga circulação deste título de crédito, nos deparamos quase que diariamente com as mais diversas dúvidas sobre a utilização do mesmo, ocasionando, em conseqüência, uma série de situações abusivas ao consumidor. Vejamos:

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Em primeiro, mister se faz esclarecer que o cheque é uma ordem de pagamento à vista e, portanto, o tão conhecido cheque pré-datado não está amparado legalmente, já que nada mais é do que uma “invenção” dos usos e costumes do comércio em geral.

Ora, tal ausência de regulamentação obriga os consumidores (emitentes do cheque) em confiar na palavra dos lojistas (beneficiários do cheque), já que estes, ao receberem um cheque pré-datado, poderão apresentar desde logo ao banco e, havendo fundos na conta do emitente, o cheque é compensado, independentemente da data contida na cártula. Da mesma forma que, na ausência de fundos, o cheque é devolvido com todas as conseqüências legais deste ato.

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Claro que há sanção para os lojistas que apresentarem antecipadamente o cheque pré-datado, posto que esta forma “inventada” de pagamento é considerada pela Justiça Brasileira como um acordo particular e verbal celebrado entre emitente e beneficiário. Assim, mesmo a legislação permitindo a apresentação antecipada do cheque pré-datado, a jurisprudência já é pacifica no sentido de que o emitente, em sendo prejudicado, poderá exigir reparação de danos. No entanto, é indiscutível que as partes devem avaliar antecipadamente a idoneidade daquele que emite ou recebe o cheque, para que o simples ato de comprar não ocasione tamanho tormento solucionável somente através de uma longa e exaustiva ação judicial.

Veja, portanto, que o cheque pré-datado pode sim ser utilizado, no entanto, ambas as partes têm que ter consciência de que a efetivação desta forma de pagamento poderá ocasionar futuros percalços. Além de que, para o estabelecimento comercial trata-se de mera liberalidade conceder a pós-datação do cheque.

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Aliás, vale ressaltar que ninguém é obrigado a aceitar o cheque como forma de pagamento. Ao revés, a legislação atual garante ao empresário o direito de aceitar somente a moeda nacional brasileira. Todavia, importa atentar-se que, ao aceitar o cheque como forma de pagamento, deverá receber o cheque indistintamente e sem impor qualquer restrição abusiva ao emitente.

Isto porque, não é raro as empresas apresentarem restrições abusivas para o recebimento do cheque. Como por exemplo, as lojas fixarem cartaz em seu estabelecimento, informando aos consumidores de que aquele estabelecimento não aceita cheques cujas contas bancárias são datadas sobre um prazo inferior de 6 meses. Tal prática, mesmo sendo usual, é imoral, abusiva e discriminatória.

Ora, é totalmente válido e aconselhável consultar previamente os bancos de dados de cadastros de inadimplentes para averiguar a idoneidade do emitente, mas se este não possuía qualquer restrição de crédito, o cheque deve ser aceito. Não cabe ao estabelecimento comercial a opção de escolher qual cliente poderá pagar através de cheque ou não. Ao contrário, ao aceitar o cheque como forma de pagamento, deve proceder de forma igualitária, sem qualquer distinção imposta pela loja.

Desta forma, da análise geral do instituto do cheque é fácil perceber que as lacunas na lei relativas ao cheque ocasionam evidentes transtornos que, apesar de não limitarem  seu uso, faz com que seja essencial a utilização deste título com precaução e cautela, já que é uma matéria que não está integralmente disciplinada por lei.

Sâmia Camila Vasconcellos Gomes

Advogada-Sócia do Escritório Polo Advogados Associados, Especialista em Direito Empresarial pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais.