QUEM AINDA SE LEMBRA DAS "DIRETAS JÁ"?

Abel Aquino

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Nosso povo e nossos políticos não aprendem com as lições do passado. Primeiro, porque não olham para trás. Segundo, porque têm pressa em construir o futuro e acham que já sabem tudo o de que precisam. Não temos heróis, não temos boas histórias para contar às próximas gerações e com isso vamos repetindo os erros do passado e empurrando,

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eternamente, o futuro para o futuro.

Veja o diálogo que anotei naquela época. Corria o longínquo ano de 1984.

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O Mauricio me ligou e eu fiquei muito contente. Nem esperei dizer o motivo de sua ligação e já fui convidando-o para ir ao Anhangabaú participar do último comício da campanha das diretas.

- Cara! Foi bom você ligar. Ia convidar você para ir com a gente ao megacomício das diretas, falei entusiamado.

- Não estou a fim de ir, respondeu.

- Que é isso!? A gente não pode perdeu um momento desse; isso é histórico, cara! - Vamos expulsar os milicos de Brasília.

- Eu não tenho essa certeza, argumentou Maurício.

- Como cara! Você é tão estudado, é de viver sempre sabendo de tudo o que se passa na política. – Achei que você é que estaria mais eufórico com essa campanha.

- Por isso mesmo, explicou. – É por estar bem informado que não acredito nessa tal campanha.

- Não entendo você.... gaguejei, frustrado.

- Bem, eu explico minha visão disso, respondeu. – Primeiro, a oposição está vendendo as eleições diretas como panacéia para todos os males do país. -Parece até que, ao acordar na manhã seguinte após eleger diretamente seu presidente, o povo vai encontrar um novo paraíso pra se viver. – Você acredita nisso?

- Bem! Penso que é uma coisa mais simbólica do que real, na verdade, justifiquei.

- Ai é que está a questão. – Para tudo, em nossa história, o que é simbólico quer dizer “faz de conta”.

- Você está sendo cruel, cara!

- Estou tentando ser realista. – com eleições diretas ou não, nós temos que trabalhar, estudar, lutar por nossas vidas e não será nenhum político que vai mudar essa realidade, meu caro, concluiu.

- Mas os militares governam contra o povo, são uma ditadura, arrematei.

- Concordo. Mas, quem garante que basta o povo poder votar pra presidente que os melhores serão eleitos para nos governar? Acredido até que o povo tende a votar nos piores, porque, num regime democrático de eleições diretas, manipular o povo passa a ser um questão de escrúpulo: quem for mais cara de pau vai ter mais chance de empolgar o povão e se eleger para o cargo que quizer.

- Não é bem assim, não, reclamei.

- Não vou dizer que o povo não sabe votar, mas também não vou dizer que uma eleição é a oportunidade do povo eleger os melhores para cargos públicos; seria muito ingenuidade da minha parte acreditar nisso.

- Nisso o que? Perguntei confuso.

- Ora, acreditar que o povo vai ter informação correta sobre a vida e intenção do candidato. Com a eleição direta vão aparecer os publicitários para criar uma embalagem dourada para o candidato e vendê-lo ao povo como um produto qualquer. Todo candidato vai parecer mais puro que anjo de Cristo.

- Então você é contra a democracia?

- Não, mas estou mais preocupado com a liberdade do que com os formalismo de sistemas políticos, sejam eles de direita ou de esquerda, militar ou civil.

- Do que você está falando?

- Veja os gloriosos lideres dessa campanha: Tancredo Neves, Franco Montoro, Mário Covas, Leonel Brizola, José Richa, Ulisses Guimarães; todos eles buscam o poder, querem afastar os militares e estabelecer a democracia “deles”, não do povo. Já estão até fazendo marketing, usando o famoso locutor de futebol, Osmar Santos para abrilhantar os comícios. O povo vai lá para aplaudir e fazer o bom papel de claque. No outro dia vão dizer aos milicos: viu só! O povo está do nosso lado, caiam fora! Nós queremos o seu lugar.

- Mas, o que podemos fazer então? Perguntei, todo confuso.

- Amigo, quem muda alguma coisa num país não são os políticos, são o povo. O objetivo de qualquer político, num regime de eleições diretas, por exemplo, é se eleger e pra se elegere vai se apresentar ao povo da maneira que o povo gosta, ou seja sem mostrar o que ele é, qual é seu caráter, sua capacidade. E quanto mais atrasado for o povo mais deseja soluções simplistas, planos imediatistas, promessas mirabolantes e não qual é a verdadeira necessidade do país. Assim tudo depende da qualidade do povo. O povo sabe o que é melhor para o país? O político corre atrás. O povo não sabe o que é melhor para o país e quer soluções mágicas? o político vai fingir que dá o que o seu eleitor quer.

- Então, pelo seu ponto de vista, não adianta lutar pela democracia, pelo fim da era militar?

- Claro que vale, mas sem empolgação. Será um avança pequenininho, mas necessário.

- Quer dizer que você não está ligando para essa campanha?

- Digamos que acredito que os militares irão embora de qualquer maneira. Mostraram-se tão incompetentes que já não vêem a hora de passar essa abacaxi para os civis. Mas, voltando ao tema das Diretas Já, digo que a oposição não tem a mínima idéia de como consertar nosso pais, quer apenas o poder, acredita, talvez ingenuamente, que com o poder nas mãos tudo será possível, inclusive construir o paraíso. E nisso eu não acredito: é mais fácil construir o inferno na terra do que saber governar uma nação respeitando a liberdade de cada um. Sinceramente tenho medo de políticos muito idealistas, daqueles que prometem encurtar o caminho para o céu. São políticos totalitários como a história nos conta claramente.

- Caramba! Você estragou minha alegria!

- Sinto muito! Não era essa minha intenção, concluiu.