Segundo o dicionário Houaiss, a palavra “mito” na rubrica antropologia é o relato simbólico, transmitido entre gerações, que narra e explica a origem de fenômenos, seres vivos, costumes e instituições.
Por extensão, representa fatos ou personagens históricos, frequentemente deformados e amplificados pelo imaginário coletivo e tradições literárias. Este conceito é essencial para a argumentação apresentada.
A Construção de Um Mito Histórico
Uma figura histórica que se torna um mito deixa vestígios no meio social ao qual pertenceu. Mesmo com tentativas de repressão de sua memória, a aceitação popular não pode ser totalmente apagada.
A ausência de registros sobre um personagem em um grupo específico indica que ele provavelmente nunca existiu naquele contexto. Esse é o caso de Jesus Cristo, o personagem mais famoso da história.
A Ausência de Registros no Judaísmo
No judaísmo e em sua tradição, não há evidências que sustentem a crença em Jesus Cristo. Os defensores dessa figura mencionam o Talmude, mas o conteúdo registrado é insuficiente para validar a narrativa mitológica de Jesus.
No Talmude babilônio, encontra-se a história de Yeishu ha-Notzri, que não se alinha ao Jesus Cristo descrito no Novo Testamento. O Talmude e outras fontes históricas não corroboram a detalhada narrativa cristã.
A Influência Grega e a Construção do Cristianismo
Curiosamente, todos os relatos sobre Jesus vêm de fora do judaísmo, sendo gregos os principais responsáveis por disseminar a história. Os pais da Igreja, de origem grega, tinham motivações claras para transformar a figura de Jesus em um mito.
Antes disso, o deus de Israel era visto como uma entidade demoníaca pelos gregos. A criação da figura de Jesus Cristo serviu como estratégia para integrar a cultura judaica à helênica, moldando o cristianismo como uma síntese filosófica.
O Contexto Cultural e a Rejeição Judaica
Os judeus resistiram à influência helênica e mantiveram sua identidade, causando desconforto entre os gregos. A rejeição ao proselitismo helênico fez com que os judeus fossem rotulados como inimigos da humanidade. Paralelamente, a influência oriental transformou a cultura helênica, ampliando as tensões entre judeus e gregos.
No século I, Filon de Alexandria tentou aproximar o judaísmo e a filosofia grega, interpretando o Velho Testamento sob a ótica neoplatônica. Esse esforço foi fundamental para a criação do cristianismo, que passou a ser visto como a filosofia das filosofias, atraindo as classes altas gregas. O Logos tornou-se a ponte entre o judaísmo e a cultura helênica.
O Cristianismo Como Síntese Cultural
A transformação de Jesus em um mito teve como objetivo consolidar o cristianismo como uma ferramenta cultural e filosófica.
Jesus foi apresentado como o Verbo que se fez carne, uma figura necessária para unir diferentes tradições sob o domínio helênico. Essa estratégia funcionou no médio prazo, mas, com o passar do tempo, as inconsistências históricas começaram a emergir.
O teólogo e filósofo alemão Bruno Bauer foi pioneiro ao argumentar que Jesus Cristo é um mito criado no século II. Sua pesquisa revelou que o cristianismo do primeiro século é uma ficção elaborada, servindo como vitória da cultura helênica sobre o judaísmo.
O Futuro do Mito de Jesus Cristo
Embora o mito de Jesus tenha cumprido sua meta, é difícil mantê-lo indefinidamente. O tempo cronológico expõe as motivações por trás de sua criação, desafiando as narrativas impostas pelos vencedores históricos.
O progresso da sabedoria humana determinará o tempo de sobrevida dessa versão cristã, permitindo que um dia todos possam reconhecer a verdade histórica.