Por mais que alguém se julgue um entendedor de alguma coisa, há sempre algo que não se sabe, a exemplo, um objeto de pesquisa, que por mais debatido e pesquisado, há sempre algo a se saber, um detalhe não percebido, uma ótica não existente na época que se pesquisou e até mesmo mudanças sofridas no campo da sensibilidade do pesquisador
Como diz um amigo pesquisador, a diferença está em se perceber a história oficial e a oficiosa. E nestes termos, me remeto aos grandes filósofos gregos quando admitiam nada saber, um dia desses li em algum lugar, não me recordo onde, que quando admitimos nada saber, estaremos no rumo certo para descobrir o além do óbvio, sendo este o primeiro passo para as maiores descobertas.
Seguindo por um esteio acadêmico, centrado no desejo de se saber mais sobre o universo musical, me atenho a teorias ou suposições, pois na falta da aptidão musical, percorro um caminho mais fácil, no meu caso, filosofar ou me atirar ao universo dos devaneios, por eu ser uma pessoa curiosa e que sempre se pega divagando por universos longínquos.
Na tentativa de responder questionamentos feitos de mim, para mim mesma, normalmente vem à tentativa de primeiro explicar significados e o lugar deles na vida humana. Parto da premissa, que se faz importante perceber a relevância da interpretação e apreciação de algo, levando-se em consideração a complexidade humana.
O universo musical para mim, um dos mais belos, nele podemos perceber e nos remeter a infinitos universos, a começar pelo sociocultural, psicológico, filosóficos, físico dentre vários, o fato é que, de uma maneira simples e direta, a música estabelece uma base racional e emocional a quem aprecia, seja na execução ou no gozo de apreciá-la como meros espectadores.
Um indivíduo não precisa entender de notas musicais, saber ler partituras para ser um bom apreciador desta arte, a sensibilidade ainda é o melhor mecanismo de análise para tal. Claro, quando uma música é lançada, surgem as mais diversas formas de análises; do critico de musica a mídia, mas o que a faz ser um sucesso ou não, serão os mais diversos ouvidos e gostos musicais.
Os ritmos, letras, idiomas às vezes não fazem muita diferença, o sentimento ou o estado de espírito do ouvinte é quem acaba elegendo esta ou aquela canção, como sendo uma das preferidas. Às vezes nos deparamos com o dito “intelectual acadêmico” que se queixa de só ouvir MPB, Clássicas, bossa, etc., ouvindo um bom e queixoso “brega”. Como diz o bordão: “gosto não se discute, se respeita”.
O fato é que a musica mexe não só com o corpo, mas com a alma, quem não já se pegou chorando ao ouvir uma? Só pra citar meu caso em particular, nasci no sertão, zona rural, fui alfabetizada aos dez anos de idade, cresci ouvindo Luiz Gonzaga, Messias Holanda, Dominguinhos, Trio Nordestino e por aí vai..., nasci no interior do ceará, e como explicar o fato de PARAÍ-BA ser uma das minhas musicas preferida?
Paraíba
Paraíba do norte, do caboclo forte
Do homem disposto esperando chover
Da gente que canta com água nos olhos
Chorando e sorrindo, querendo viver
Do sertão torrado, do gado magrinho
Do açude sequinho, do céu tão azul
Do velho sentado num banquinho velho
Comendo com gosto um prato de angu
Acende o cachimbo, dá uma tragada
Não sabe de nada da vida do sul
Paraíba do norte que tem seu progresso
Que manda sucesso pra todo país
Que sente a presença da mãe natureza
Que vê a riqueza nascer da raiz
Que acredita em deus, também no pecado
Que faz do roçado a sua oração
E ainda confia no seu semelhante
E vai sempre avante em busca do pão
O pão que é nosso, que garante a vida
Terrinha querida do meu coração
É uma bela música, é verdade, mas desde os meus cinco anos adoro esta música, e até hoje me emociono ao ouvi-la.
Luiz Gonzaga pra mim, sempre foi à estrela máxima da música, cada frase pronunciada em forma de canção, cada discurso musicado, uma aula de sensibilidade, não dá para negar, o mestre Gonzaga nos ensinou e nos ensina a amar cada pedacinho do nordeste, a ter orgulho de ser nordestino. Gonzaga apresentou o nordeste brasileiro para o Brasil, antes dele, o nordeste era uma parte do Brasil relegada ao ostracismo sociocultural. Um negro pobre e nordestino que saiu fugido de seu torrão natal, mostrou o Brasil que os brasileiros desconheciam, levou para cada coração sertanejo que batia nas terras sulistas, a lembrança de seu lugar deixado, quando de partida na busca pela sobrevivência.
Um dia desses ouvi uma música infantil de Gonzaga que eu não conhecia, gravada no disco do palhaço Bozo e outra que falava de erosão, eu que pensava ter ouvido tudo de Gonzaga..., e é sempre uma emoção indescritível, nós realmente não temos a dimensão do tamanho deste homem, por maior que pensamos ser Gonzaga, ele sempre nos fará uma surpresa boa.
Sou uma apaixonada pelo universo gonzagueano, nele aprendi inúmeras coisas, aprendi a respeitar adversidades, a ver o sertão pela ótica da beleza, e cá pra nós, pra sentir as nuanças do sertão, “o cristão tem que andar a pé”, não dá para entender o sertão lendo jornais ou romances, se faz necessário sentir seu cheiro, andar por estradas de terra ladeada por marmeleiros secos ou esverdeados, ver mandacarus com flores e frutos, um pé de serigüela carregado...
Não tenho o dom nem a competência literária de uma Rachel de Queiroz, que da varanda de sua casa em “Não-me-deixes” teve inspirações para escrever o “ O Quinze” o “ Memorial de Maria Moura” dentre tantas outras obras fantásticas.
Só nos resta agradecê-los por eles terem nos deixado tão belas obras acerca da vida sertaneja, sejam elas escritas e/ou musicadas.
E assim, “minha vida é andar por este país/ pra ver se um dia descanso feliz, guardando as recordações (...)” de momentos, pessoas e canções inesquecíveis, e os que eu não puder carregar pela mão, levarei no coração.
Juliana Pereira
Quixadá, 15 de fevereiro de 2009
Às 01h:30 de uma madrugada solitária, porém, não triste.